Ártemis e Diana #0096

As duas faces da mesma deusa

O mito de Ártemis...

Há muito tempo, Leto, a deusa da maternidade, filha de Titã Coio e Fébë, estava sendo perseguida por Hera, a rainha dos deuses. Isso se deu porque Zeus, marido de Hera, estava apaixonado por Leto e nesta relação extraconjugal a engravidou. 

Enfurecida e enciumada, Hera decretou que nenhum lugar na terra firme permitiria que ela desse à luz. Leto, então,  vagou pelo mundo, exilada e cansada, até encontrar a pequena ilha de Delos, que flutuava livremente no mar e estava disposta a acolhê-la.

Ali, cercada pela solidão e pelo silêncio das águas, ela trouxe ao mundo dois filhos extraordinários: primeiro Ártemis e logo depois seu irmão gêmeo, Apolo.

Ainda no nascimento, Ártemis revelou sua natureza singular: mesmo recém-nascida, ajudou a mãe a dar à luz seu irmão, mostrando que se dedicaria a ser protetora da vida e do parto. Desde esse instante, ficou claro que Ártemis não era uma deusa comum; ela seria guardiã das mulheres e dos jovens, defensora da virgindade e da natureza selvagem.

À medida que crescia, Ártemis tornou-se uma caçadora incansável. Com seu arco e flechas, percorria florestas e montanhas, acompanhada de cães leais e de ninfas que compartilhavam sua devoção à castidade e à liberdade. 
Ártemis gostava da solidão e da companhia de quem respeitava a vida natural, mas punia severamente quem ousasse violar sua integridade ou desrespeitar seus santuários. 

Um dos episódios mais conhecidos de sua fúria ocorreu com o jovem Acteon. Ele, inadvertidamente, esbarrou na deusa enquanto ela se banhava nua em um lago escondido. Ártemis, enfurecida por sua imprudência, transformou-o em um cervo, e os próprios cães de caça de Acteon o perseguiram até a morte, cumprindo o destino que o havia alcançado por seu descuido.

Em outro mito, a soberba de Niobe trouxe sua ruína. Niobe zombou de Leto, afirmando que tinha mais filhos e, portanto, mais merecedora de reverência. Ártemis, em lealdade à mãe, lançou suas flechas precisas, ceifando todos os filhos de Niobe, mostrando que nenhum insulto à deusa passaria sem punição.

Ártemis - Museu do Vaticano
por Giuliana Fuganti, 24/set/2024
Apesar de seu lado vingativo, Ártemis também protegia aqueles que respeitavam suas leis. Ela guiava o parto das mulheres e defendia os inocentes da ameaça de predadores, humanos ou animais. 

Ártemis encarnava a força da natureza: bela, implacável, livre e incorruptível, um símbolo de poder feminino que não se curvava às paixões dos mortais nem aos caprichos dos deuses.

E assim, ela vagava pelo mundo, entre bosques e montanhas, como eterna guardiã da juventude, da castidade e da vida selvagem, lembrando a todos que o equilíbrio entre liberdade e respeito é sagrado, e que a natureza — assim como a própria deusa — não tolera desrespeito.

***

O mito de Diana....

Em tempos antigos, na Itália antiga, os povos latinos e etruscos reverenciavam uma deusa que reinava sobre florestas, animais selvagens e os mistérios da lua. 

Seu nome era Diana, deusa da caça, protetora das mulheres e guardiã da pureza. Com o tempo, sua imagem se fundiu à de Ártemis, herdando sua destreza com o arco, sua ligação com a lua e seu amor pelos bosques, mas adquirindo uma presença mais ampla na vida dos mortais.

Diana era adorada não apenas nos recantos remotos da natureza, mas também em santuários e templos, como o famoso de Arícia, onde sacerdotisas dedicadas a ela mantinham viva a devoção à castidade e à proteção feminina. 

Nessas cerimônias, ela era celebrada tanto como guardiã da juventude quanto como deusa da fertilidade, representando um equilíbrio delicado entre a liberdade selvagem e os ciclos da vida humana.

Embora compartilhasse com Ártemis a habilidade de punir aqueles que a desrespeitassem, Diana era vista de forma menos temível e mais protetora. Ela intervinha para ajudar as mulheres durante o parto e para proteger os inocentes, mas também guiava os caçadores e inspirava os mortais a viver em harmonia com a natureza. Sua influência se estendia às cidades e ao campo, e sua presença lembrava que a vida, seja selvagem ou civilizada, dependia de respeito e equilíbrio.

Em contraste com Vênus, que despertava os desejos e a paixão nos corações humanos, Diana ensinava a disciplina e o respeito pela vida e pela liberdade. 


Ela era a luz da lua sobre os bosques, a caçadora silenciosa que observava, mas também a protetora silenciosa de quem respeitava as leis da natureza.

Diana percorria bosques, rios e colinas, acompanhada por suas ninfas e pelos animais que protegiam, eternamente vigilante. 

Sua imagem era ao mesmo tempo selvagem e maternal, e sua presença lembrava aos mortais que a força da natureza e da virtude feminina precisava ser honrada, respeitada e compreendida. 

Na fusão de mitos e rituais romanos, Diana se tornou símbolo de liberdade, pureza e proteção, unindo os mistérios da lua, a coragem da caça e a serenidade do cuidado, refletindo a complexidade da vida em todas as suas formas.


Depois de termos percorrido um pouquinho o caminho dos dois mitos, vamos ver mais algumas informações sobre Ártemis e Diana:

1. Ártemis (mitologia grega)

  • Origem: Deusa grega, filha de Zeus e Leto, irmã gêmea de Apolo.

  • Domínio: Deusa da caça, da vida selvagem, da lua, da virgindade e protetora das crianças e das mulheres em parto.

  • Atributos e símbolos: Arco e flechas, veado, cão de caça, lua crescente.

  • Função e caráter: Ártemis é associada à liberdade, independência e pureza. Era protetora da natureza e da vida selvagem, mas também podia ser vingativa quando ofendida.

  • Culto: Havia templos e santuários dedicados a ela em várias cidades gregas, como Éfeso, onde o Templo de Ártemis era considerado uma das Sete Maravilhas do Mundo Antigo. Era invocada para proteção de crianças e jovens, bem como em rituais de caça.

Como deusa da caça, da lua e da virgindade, Ártemis tinha um culto marcado por normas bem rígidas, sobretudo quanto à pureza. Algumas dessas “leis sagradas” ou preceitos eram:

  • Castidade absoluta – Ártemis era virgem, e suas seguidoras (ninfas e sacerdotisas) também deviam manter-se castas. Quem violasse isso sofria punições (como Calisto, que foi transformada em ursa).

  • Respeito aos animais e à natureza – embora fosse deusa da caça, Ártemis também protegia animais selvagens e castigava caçadas desrespeitosas ou excessivas.

  • Proibição de ver a deusa nua – um tabu célebre: Acteão a viu banhando-se e foi transformado em cervo, sendo despedaçado pelos próprios cães.

  • Proteção das mulheres e crianças – era protetora de parturientes, e seu culto envolvia oferendas antes e depois do parto.

  • Sacrifícios rituais – em algumas cidades (como Esparta e Braurônio, na Ática), cultuava-se Ártemis com ritos específicos, incluindo provas de resistência e até flagelações rituais.

Não eram “leis civis”, mas sim normas míticas e rituais, que devotos e sacerdotes seguiam em honra à deusa.

2. Diana (mitologia romana)

  • Origem: Deusa romana, considerada equivalente a Ártemis na mitologia grega, mas com traços adicionais ligados à agricultura e ao ciclo lunar.

  • Domínio: Deusa da caça, da lua, da fertilidade, da virgindade e protetora das mulheres e dos animais selvagens.

  • Atributos e símbolos: Arco e flechas, cervo, lua crescente, cães de caça, florestas.

  • Função e caráter: Diana manteve muitos aspectos de Ártemis, sendo também uma deusa da proteção feminina e da natureza. Nos mitos romanos, Diana às vezes se confunde com Hécate, relacionada à magia e à noite.

  • Culto: Um dos centros principais de seu culto era o santuário de Diana em Nemi, próximo ao lago de Nemi, chamado “Diana Nemorensis”, ligado a rituais de iniciação e à proteção da comunidade. Era uma das deusas mais veneradas na Roma antiga, especialmente por mulheres.

Enquanto Ártemis era mais ligada ao mito e ao simbolismo de caça e virgindade, Diana em Roma tinha forte função religiosa e política, especialmente como protetora da plebe e das mulheres.


E o que podemos falar sobre “leis sagradas” ou tabus associados à Diana dos romanos?

  1. Virgindade e Pureza – Assim como Ártemis, Diana era virgem e exigia castidade de suas sacerdotisas.

  2. Proteção da Lua e da Noite – Era guardiã dos viajantes noturnos e dos ciclos lunares, devendo ser invocada com ritos em noites de lua cheia.

  3. Defesa das Mulheres e dos Escravos – Seu templo no Monte Aventino, em Roma, era um asilo sagrado, onde escravos fugitivos e pessoas perseguidas podiam encontrar proteção. Essa era uma “lei” central do culto a Diana.

  4. Rituais em Nemorália – Na festa da Nemorália (13 de agosto), todos deviam respeitar três proibições:

    • Não caçar;

    • Não derramar sangue;

    • Honrar a deusa com tochas, coroas de flores e procissões ao redor do lago de Nemi.

  5. Lei da Floresta Sagrada – O bosque de Nemi, próximo ao templo de Diana, era intocável. Desrespeitar a floresta era violar a deusa.

  6. Lei do Rei do Bosque (Rex Nemorensis) – Um costume único: o sacerdote de Diana em Nemi só assumia o posto matando seu predecessor em combate. Era uma lei ritual de sucessão sangrenta, que simbolizava a força selvagem da deusa.


3. Comparação resumida

AspectoÁrtemis (Grega)Diana (Romana)
PaiZeusZeus (assimilado), Leto
IrmãoApoloApolo (assimilado)
Domínio principalCaça, lua, virgindade, proteção infantilCaça, lua, virgindade, fertilidade, proteção feminina
SímbolosArco e flechas, veado, cão, luaArco e flechas, veado, cães, lua
Culto principalTemplos em Éfeso e outras cidadesSantuário de Diana em Nemi
CaráterIndependente, protetora e vingativaProtetora, ligada à natureza e à fertilidade



Significados dos nomes:

Ártemis

  • Origem: Grega.

  • Significado possível: A etimologia não é totalmente clara, mas há algumas teorias:

    1. “Artemesia” ou “Artemisios”, relacionado a “segura”, “cuidado” ou “saudável” — refletindo seu papel de protetora da vida e da saúde.

    2. Possível conexão com a palavra “artemes”, que significa “intacta” ou “inviolada”, associando-se à sua virgindade e pureza.

  • Interpretação: Seu nome reflete seu caráter de deusa protetora, associada à vida, à natureza e à virgindade.


Diana

  • Origem: Romana.

  • Significado: O nome pode derivar da raiz latina “diviana”, que significa “celestial” ou “divina”.

  • Interpretação: Reforça seu caráter de deusa ligada à lua, à luz celestial e à natureza sagrada, sendo considerada protetora das mulheres e da fertilidade.


Enquanto Ártemis representa a selvageria indomada, a pureza rígida e a ligação íntima com a natureza para os gregos, Diana representa a protetora da comunidade, ligada à liberdade, ao asilo e à lua como guia coletiva para os romanos.


Para descontrair: Se as leis das duas deusas, à semelhança do relato bíblico sobre a lei de Moisés, fossem colocadas em tábuas, será que seriam assim?


Imagem gerada por IA




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