Ares e Marte — deus da guerra violenta #0099
Ares nasceu da união de Zeus e Hera, mas desde o início sua presença foi marcada pela violência e pelo conflito. Diferente de sua meia-irmã Atena, que ensinava a arte da guerra com sabedoria e estratégia, Ares encarnava a brutalidade do combate, o caos e a fúria desmedida. Onde passava, deixava atrás de si batalhas sangrentas e destruição.
Mesmo entre os deuses do Olimpo, Ares era temido e pouco estimado. Sua impetuosidade e agressividade, em vez de trazer ordem ou vitória, frequentemente criavam mais problemas do que soluções. Ele simbolizava o aspecto irracional da guerra, lembrando que a força sem razão pode ser tão perigosa para os aliados quanto para os inimigos.
Um dos episódios mais célebres de sua mitologia envolve o romance ilícito com Afrodite, deusa do amor e esposa de Hefesto. O relacionamento era secreto, mas quando Hefesto descobriu a traição, forjou uma rede invisível e inquebrável, aprisionando os amantes nus em sua cama. Chamou então todos os deuses para testemunhar o escândalo. Ares, que se orgulhava de sua força, foi humilhado diante do Olimpo, mostrando que a violência não era invencível diante da astúcia e da inteligência. Dessa união nasceram filhos que refletiam tanto o terror quanto o equilíbrio: Fobos (Medo) e Deimos (Pavor), companheiros do pai nos campos de batalha, Harmonia, deusa da concórdia, e, em algumas tradições, também Eros, a personificação do desejo.
Outro mito mostra um lado diferente de Ares. Quando Halirrócio, filho de Posídon, tentou violentar sua filha Alcipe, o deus o matou em defesa da jovem. Pelo crime, foi levado a julgamento em Atenas, na colina que passou a ser conhecida como Areópago. Absolvido, sua história ficou marcada como uma das raras ocasiões em que Ares aparece associado a um ato de justiça.
Ainda assim, a maior parte de seus descendentes mortais reforça sua natureza destrutiva. Cicno, por exemplo, emboscava viajantes para matar e usar seus ossos como material de construção de um templo. Héracles, porém, o derrotou. Outro filho, Diomedes da Trácia, nutria seus cavalos com carne humana e teve o mesmo destino, morto pelo herói. Assim, a linhagem de Ares perpetuava a violência e a selvageria que ele representava.
Durante a Guerra de Troia, Ares lutou ao lado dos troianos. Enfrentou o herói grego Diomedes, mas este, auxiliado por Atena, conseguiu feri-lo gravemente com uma lança. O brado de dor de Ares ecoou como o clamor de milhares de guerreiros, e o deus fugiu para o Olimpo, onde se queixou a Zeus. Seu pai, porém, repreendeu-o duramente, chamando-o de instável e detestável. A cena cristalizou a imagem de Ares como um deus poderoso, mas impulsivo, incapaz de controlar sua própria natureza.
Apesar de sua má fama, Ares não deixou de ter cultos importantes. Em cidades como Esparta e Tebas, onde a guerra era exaltada como parte da identidade coletiva, ele era reverenciado como patrono dos guerreiros. Contudo, para grande parte dos gregos, continuou a simbolizar a guerra em seu aspecto mais brutal e destrutivo, a violência que nasce do impulso cego.
Ares, em sua essência, representava o lado sombrio da guerra: o sangue, o medo, a agressão e a irracionalidade. Em contraste com Atena, mostrava que a força sem prudência conduz à desordem. Seus mitos lembram que coragem e poder físico não bastam por si só; é a sabedoria, aliada à disciplina, que torna qualquer poder legítimo e duradouro.
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Em Roma, a figura de Marte emergiu como uma divindade central, inicialmente ligada à agricultura, à fertilidade e à proteção dos campos. Sua função primordial era assegurar a prosperidade da comunidade, protegendo as colheitas contra pragas e desastres naturais. Com o tempo, Marte assumiu também o papel de deus da guerra, tornando-se o patrono da disciplina militar, da ordem e da defesa do Estado.
O mito mais importante de Marte conecta-o diretamente à fundação de Roma. A vestal Reia Sílvia, encarregada do fogo sagrado, foi seduzida ou violentada pelo deus, gerando os gêmeos Rômulo e Remo. Por quebrar seu voto de castidade, Reia viu seus filhos serem lançados ao rio Tibre, mas eles foram salvos por uma loba, animal sagrado de Marte, e posteriormente criados por um pastor. Crescendo fortes e determinados, os gêmeos se tornaram líderes. Rômulo, em um conflito com Remo, acabou matando o irmão e fundou Roma, estabelecendo Marte como ancestral divino da cidade e símbolo da força e da disciplina que guiaria o povo romano.
Com a consolidação da cidade, Marte passou a ser cultuado como deus da guerra e da ordem social. Rituais como o suovetaurilia, em que eram sacrificados porco, carneiro e touro para purificar os campos, conectavam fertilidade agrícola e proteção militar. O mês de março, Martius, marcava o início das campanhas militares, e os sacerdotes Salii realizavam procissões solenes carregando escudos sagrados, celebrando a força, a disciplina e a proteção divina. A devoção a Marte refletia a identidade romana: coragem, dever e disciplina não eram apenas virtudes individuais, mas fundamentos da comunidade e do Estado.
Roma, então, começou a dominar o mundo antigo por meio de sua força militar, organização administrativa e estratégia diplomática. O exército romano era disciplinado e eficiente, e cada cidadão tinha vínculo com o serviço militar. Além disso, Roma integrava os povos conquistados por meio de alianças, cidadania parcial ou plena e imposição de tributos, permitindo que diferentes culturas compartilhassem instituições, leis e costumes. A construção de estradas, aquedutos e cidades facilitava a circulação de tropas, mercadorias e ideias, unificando vastos territórios.
A cultura romana se espalhou não apenas pelo poder militar, mas também pelos valores, língua e religiões. O latim se tornou a língua da administração e do direito, estabelecendo uma comunicação uniforme e influenciando a formação das línguas modernas. Deuses romanos como Marte eram adaptados e fundidos com divindades locais, promovendo uma identidade compartilhada entre diferentes povos. Festivais, moedas, arquitetura e organização urbana ajudavam a “romanizar” as cidades conquistadas, mesmo sem necessidade de dominação violenta constante.
O legado romano chega até os dias atuais de formas surpreendentemente concretas. O direito moderno, incluindo conceitos de contratos, propriedade e cidadania, deriva diretamente do direito romano. A engenharia, o planejamento urbano e a infraestrutura, como estradas, pontes e sistemas de abastecimento de água, inspiraram a organização de cidades modernas. Valores como disciplina, coragem, dever cívico e serviço à comunidade, que sustentavam o ethos romano, continuam presentes em exércitos, governos e educação cívica contemporânea. A própria ideia de cidadania, de leis universais e de governança multicultural tem raízes na experiência de Roma como império.
Assim, Marte não é apenas uma figura mitológica; ele simboliza a fusão de força, disciplina e proteção que sustentou Roma e moldou sua cultura, a qual, mesmo milênios depois, ainda define parte do mundo moderno. O mito e a civilização que ele inspirou mostram como a religião, a guerra e a organização social se entrelaçam, criando legados duradouros que vão além da história, até a estrutura e os valores de nossas sociedades contemporâneas.
Vamos aprofundar esta História?
Como Roma dominou o mundo da época?
Roma não se tornou um império da noite para o dia. O domínio romano ocorreu por meio de expansão militar, diplomacia estratégica e organização política:
Estratégia diplomática e alianças: Roma combinava força com diplomacia. Cidades conquistadas eram frequentemente integradas por meio de alianças, cidadania parcial ou plena e obrigações militares. Isso criava lealdade ou dependência sem precisar destruir completamente as sociedades conquistadas.
Como Roma difundiu seu modo de pensar?
Roma difundiu não apenas sua política, mas sua cultura, valores e ideias:
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Religião e mitologia: Deuses como Marte eram integrados à vida cívica e militar, ensinando disciplina, coragem e dever. Ao adotar deuses locais em territórios conquistados e fundir suas tradições com a romana, Roma criava uma identidade compartilhada.
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Língua: O latim tornou-se a língua oficial da administração, direito e comunicação. Isso deixou legado nas línguas românicas modernas (italiano, francês, espanhol, português, romeno) e nos termos legais, científicos e religiosos do mundo ocidental.
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Urbanismo e engenharia: Cidades romanas eram organizadas com fóruns, templos, aquedutos e teatros. Esse modelo urbano espalhou conceitos de civilidade, cidadania e participação cívica.
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Cidadania e lealdade: Roma criou o conceito de cidadania como privilégio e dever. Pessoas de diferentes regiões podiam obter cidadania romana mediante serviços militares ou lealdade política, integrando comunidades diversas em torno de uma identidade comum.
No Império Romano, legionários de várias regiões da Hispânia, Gália e Síria serviam no exército, aprendiam leis romanas e difundiam costumes e língua em suas cidades natais.
Como Roma se liga ao mundo de hoje?
O legado de Roma é visível em muitos aspectos da sociedade moderna:
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Leis e governança:
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Muitos sistemas jurídicos modernos derivam do direito romano.
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Conceitos como contratos, propriedade, cidadania e tribunais têm raízes romanas.
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Infraestrutura e engenharia:
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Estradas, pontes e sistemas de abastecimento de água inspiraram a engenharia urbana moderna.
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O planejamento de cidades com praças, fóruns e redes de circulação tem ecos nos centros urbanos atuais.
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Cultura e língua:
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Línguas românicas derivam do latim.
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Literatura clássica romana influencia narrativa, filosofia e retórica até hoje.
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Mitologia romana e grega ainda inspiram arte, cinema e literatura contemporânea.
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Valores sociais e militares:
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Ideias de disciplina, dever, virtude cívica e serviço à comunidade vêm do ethos romano, refletido em exércitos modernos, sistemas políticos e educação cívica.
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Ideologia imperial e identidade nacional:
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Roma ensinou o conceito de estado unificado e governança multicultural, que inspirou impérios posteriores e até a noção moderna de nação e direito internacional.
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Tribunais modernos, códigos legais, exércitos organizados e a própria ideia de cidadania têm raízes diretas na experiência romana.
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Festivais cívicos, arquitetura monumental e a valorização do espaço público ainda seguem padrões romanos adaptados ao mundo contemporâneo.
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